Lixo nas ruas da China vira problema terrível e reflete as mudanças econômicas do país

de Bruno Rizzato 0

Imagine um lugar onde o lixo faz parte da paisagem das ruas. A cada passo, você ouve o barulho de uma garrafa de plástico e encontra mais lixo do que animais. Latas de lixo estão espalhadas em cada esquina, mas as pessoas jogam um maço de cigarros vazio no chão.

Não estamos falando do Brasil, e sim, da China. Como um país em desenvolvimento rápido, a China produz cerca de 300 milhões de toneladas de resíduos por ano, sendo a maioria oriunda de suas grandes cidades. Segundo estimativas, em 2025, a China terá uma produção de quase 562 milhões de toneladas de resíduos por ano.

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A China teve um boom em sua economia ao longo dos últimos 30 anos, e os residentes rurais continuam migrando para as grandes cidades na esperança de prosperidade. Com a urbanização crescente, estima-se que o consumo monetário nos lares chineses aumentará de 10 trilhões de yuanes (6 trilhões de reais), em 2012, para 27 trilhões de yuanes (16 trilhões de reais), em 2022.

De acordo com a gestora global de consultoria empresarial, McKinsey & Company, 15% do consumo urbano vem de gerações mais jovens. Estes jovens consumidores são propensos a comprar produtos mais novos e modernos – mais caros -, como resultado da ocidentalização. As gerações mais velhas estavam focadas na manutenção da segurança econômica, mas a ambição capitalista no sentimento do jovem chinês expressa a sua independência e status social através do aumento do consumo.

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O crescimento econômico induz ao consumismo, gerando uma grande quantidade de resíduos. Como as pessoas começam a categorizar-se como “detentora ou não de posses”, o desrespeito com a responsabilidade social e a falta de orgulho cívico passam a ser evidentes. Isto fez com que os cidadãos abandonassem hábitos tradicionais e, de acordo com Lisa Christensen, diretora executiva da empresa Hong Kong Cleanup, aparecesse a mentalidade de “os outros recolhem meu lixo”. Estudos de campo também demonstraram que as pessoas tendem a imitar os vizinhos, até mesmo nos hábitos de descarte. A massificação abstém as pessoas do sentimento de culpa.

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Uma pesquisa mostrou que 68% dos motoristas de carro e 95% dos motoristas de caminhão jogam lixo pelas janelas de seus veículos em movimento, em estradas e rodovias, apenas por conveniência. Tais situações têm causado uma tensão entre trabalhadores do saneamento básico e as novas famílias de classe média alta. Muitos moradores ainda acreditam que seu lixo fornece trabalho para quem precisa. Porém, com tanto lixo sendo despejado, nem mesmo as equipes de limpeza contratadas conseguem dar conta. 

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Apenas em Hong Kong, cerca de 16.000 toneladas de resíduos são despejadas todos os dias, totalizando 6,5 milhões de toneladas por ano. Os aterros sanitários estão perto da capacidade total. Com mais produtos sendo consumidos e jogados fora todos os dias, está se tornando cada vez mais difícil para o ecossistema se manter saudável. Atualmente, jogar lixo em Hong Kong é um crime passível de multa, mas mesmo assim, o hábito parece não ter fim. “Sem aplicação coerente, as multas não tiveram um impacto significativo sobre o problema de jogar lixo nas ruas, na China”, escreveu Briana Jones para o portal “All That Is Interesting”.

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Ativistas ambientais estão cientes do problema. O capitalismo cresce na China a um ritmo assustadoramente rápido e o crescimento econômico se tornou o foco da maioria das pessoas, ofuscando as preocupações ambientais. No Dia da Terra, comemorado em 22 de abril de 2015, a Nature Conservancy e a revista on-line Ecozine, uniram-se para combater o problema do lixo na China. Usando dados de análise de DNA, a campanha denominada “The Face of Litter” procurou identificar as pessoas que sujavam as ruas de Hong Kong e grande parte da China.

A ideia foi apresentada por algumas agências de publicidade locais como uma maneira de, publicamente, envergonhar os cidadãos sem consciência. Isso provocou uma discussão muito necessária sobre o assunto. Ativistas coletaram várias peças de lixo em terrenos urbanos populares e extraíram as amostras de DNA. Em seguida, o DNA foi usado para gerar 27 compósitos faciais que representaram com precisão a cor dos olhos, cabelo e pele, sardas, gênero, formato do rosto, e ascendência biogeográfica dos poluidores.

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Com a reconstrução facial aproximada feita, banners foram instalados em 10 estações do metrô de Hong Kong – de onde boa parte dos resíduos foram recolhidos –, contendo uma espécie de “retrato falado” das pessoas que poluíram o local. Os rostos nos cartazes eram realistas mas não determinavam uma correspondência exata. Esta ambiguidade chamou a atenção de pedestres, que tentavam ver se eram os culpados. A campanha aconteceu de 22 a 29 abril do ano passado. A atitude demonstra que a China pode estar pronta para lutar contra o problema, esclarecendo que cada um de seus habitantes possui uma parcela da culpa sobre a poluição ambiental.

[ All That Is Interesting ] [ Foto: Reprodução / All That Is Interesting ]

Jornal Ciência