Name: Psicólogo brasileiro se passa por gari por 8 anos para realizar experiência social e mostrar triste realidade
Uploaded: 2016-04-15T15:57:31-03:00
Channel: Rafael Fernandes
Description: Viver e se relacionar com as pessoas é uma experiência que traz muito aprendizado para o ser humano. As pessoas crescem, erram, aprendem coisas, inventam novidades, interagem e promovem uma

Viver e se relacionar com as pessoas é uma experiência que traz muito aprendizado para o ser humano. As pessoas crescem, erram, aprendem coisas, inventam novidades, interagem e promovem uma relação com sentimentos que deixam impressões nas pessoas.

A convivência com o ser humano é uma forma de experimentação de si mesmo e do outro, que muita gente admira. A Psicologia é uma ciência que busca estudar o comportamento humano, o que se passa pelos processos de inteligência, emoção, aprendizagem, percepção e sensações.

Um psicólogo social que fez mestrado e doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), Fernando Braga da Costa, vestiu um uniforme do serviço de limpeza e trabalhou como gari, varrendo as ruas da universidade, por 8 anos, em prol de uma experiência social impressionante.

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Ele sempre teve interesse em um projeto dessa vertente. “Para mim, sempre foi uma situação constrangedora, enigmática. Então, quando surgiu essa oportunidade, eu agarrei e fui agarrado por ela. Eu sempre vivi em um bairro de classe média alta, então foi uma coisa que sempre me chamou a atenção”.

O objetivo da experiência era terminar sua tese de mestrado sobre invisibilidade pública. Ele exercia as atividades apenas em meio período do dia e optou por não receber o valor pago aos trabalhadores que exercem essa profissão, a importância de R$ 400,00 à época, em 2004.

No site do Instituto de Psicologia da USP, ele publicou a experiência: “Quando comecei o projeto, era uma coisa assim, de denúncia, bem ingênua. Mesmo quando eu questionava as coisas, eu fazia de forma muito pouco estruturada. E a grande modificação, o grande progresso que eu tive em todos esses anos aconteceu quando percebi que os fatos já falam por si.”

Numa ocasião em que estava sentado para descansar com alguns companheiros de trabalho, um dos garis disse: “Nossa, Fernando, dá uma olhada para o céu”. Ele olhou para cima: “Estava aquele céu de brigadeiro, como dizem, azulzinho, às 7 da manhã o sol já ardia”.

E o gari completou: “Nossa, o tempo tá ruim, hein?”. Foi então que ele entendeu a relatividade entre os trabalhos: “Para essas pessoas, é tudo tão relativo. Aquele céu azul é maravilhoso para quem está trabalhando dentro do escritório, com ar-condicionado. Mas, para eles, é sinônimo de esforço e desgaste redobrado”.

Ele foi se habituando à medida que o tempo passava, e isso, segundo ele, foi uma das maiores tristezas: habituar-se à inexistência perante a sociedade. “Quando eu via um professor se aproximando, professor meu, até parava de varrer, porque ele ia passar por mim, podia trocar uma ideia, mas o pessoal passava como se estivesse passando por um poste, uma árvore, um orelhão.”

“A cada dois minutos escrevendo sobre essa experiência, me são exigidos outros 10 minutos chorando. Eu já tive, várias vezes, de parar de escrever ao lembrar dos fatos, pois é uma experiência emocionalmente carregada”.

Ele ressalta no estudo que “as pessoas enxergam apenas a função social do outro. Quem não está bem-posicionado sob esse critério vira mera sombra social”.

“Eu choro. É muito triste, porque, a partir do instante em que você está inserido nessa condição psicossocial, não se esquece jamais. Acredito que essa experiência me deixou curado da minha doença burguesa. Esses homens hoje são meus amigos. Conheço a família deles, frequento a casa deles nas periferias. Eu mudei! Nunca deixo de cumprimentar um trabalhador”, disse.

Ele prossegue seu relato: “Faço questão de o trabalhador saber que eu sei que ele existe. Eles são tratados piores que um animal doméstico, que sempre é chamado pelo nome. São tratados como se fossem uma COISA. Ser IGNORADO é uma das piores sensações que existem na vida!”, afirma Fernando, na esperança de que o sucesso de sua pesquisa mude um pouco a visão que temos sobre as pessoas que não percebemos, mesmo estando bem à nossa frente.

A invisibilidade social é um fenômeno que ocorre quando algumas pessoas são ignoradas ou “apagadas” no convívio social, muitas vezes devido à posição que ocupam ou ao tipo de trabalho que realizam. Esse conceito, estudado pelo pesquisador Fernando Braga da Costa, relaciona-se a dois problemas presentes nas sociedades capitalistas: a humilhação social e a reificação.

A humilhação social acontece quando uma pessoa tem sua subjetividade, ou seja, sua individualidade e emoções, subordinada de forma agressiva à vontade ou percepção de outra pessoa. Já a reificação transforma o indivíduo em um objeto, reduzindo-o ao que ele produz e tratando as relações humanas como meras transações de mercado.

Esses fenômenos, segundo Costa, nos fazem refletir sobre atitudes comuns em nosso dia a dia. Ignoramos, por exemplo, trabalhadores como garis, motoristas de ônibus e outros que, por não desempenharem funções diretamente ligadas a nós, acabam sendo tratados como “invisíveis”.

A invisibilidade social, portanto, não é apenas uma questão individual, mas também uma construção coletiva. Ela envolve fatores psíquicos e sociais que tornam esse processo naturalizado, ou seja, algo que muitas vezes nem percebemos. Essa naturalização impede que enxerguemos a invisibilidade como um problema social ou como resultado de desigualdades históricas e econômicas, reforçando sua presença em nossas vidas.

Reconhecer e combater a invisibilidade social exige mais do que empatia. É preciso entender que se trata de uma questão estrutural e que, ao ignorar pessoas em situações de vulnerabilidade ou em profissões desvalorizadas, perpetuamos um ciclo de exclusão e desigualdade.