Milhões de pessoas já assistiram ao filme Gravidade, estrelado por Sandra Bullock e George Clooney, em que os astronautas ficam à deriva no espaço após uma missão ao Telescópio Espacial Hubble dar terrivelmente errado.
O conceito do filme, embora dramático, reflete algo que os cientistas acreditam ser uma possibilidade muito real.
No filme, Bullock e Clooney estão reparando o Hubble quando recebem um aviso da Missão Controle, em Houston, para acelerarem o trabalho, pois um satélite espião foi atingido, criando uma nuvem de destroços em órbita da Terra e vindo em direção a eles.
A partir daí, uma reação em cadeia ocorre: os destroços atingem satélites de comunicação e destroem tanto o Hubble quanto a Estação Espacial Internacional (ISS). Isso reflete a chamada síndrome de Kessler, que cientistas temem ser uma ameaça real à medida que a corrida espacial se intensifica com iniciativas como a SpaceX de Elon Musk.
O que é a síndrome de Kessler?
A exploração espacial pela humanidade já dura mais de meio século, sendo um dos grandes mistérios que buscamos entender. No entanto, com ela surgem problemas, e os cientistas da NASA, Donald Kessler e Burton Cour-Palais, propuseram um cenário potencialmente desastroso.
Em 1978, os dois especialistas teorizaram que, à medida que mais e mais espaçonaves são enviadas ao espaço, o risco de colisão aumenta à medida que a órbita da Terra se torna mais lotada.
Segundo a NASA: “Foguetes gastos, satélites e outros detritos espaciais se acumularam em órbita, aumentando a probabilidade de colisões. Essas colisões criam mais detritos, gerando uma reação em cadeia conhecida como síndrome de Kessler, nomeada em homenagem ao cientista que propôs essa questão, Donald Kessler.”
Por que os cientistas estão preocupados com a síndrome de Kessler?
Alguns especialistas acreditam que é apenas uma questão de tempo até que a síndrome de Kessler se torne realidade.
John L. Crassidis, professor de inovação e especialista em detritos espaciais da Universidade de Buffalo, Nova York, afirmou: “A síndrome de Kessler vai se tornar realidade. Se a probabilidade de uma colisão se tornar tão grande que não podemos mais colocar satélites no espaço, então estaremos em apuros.”
Atualmente, mais de 10.000 satélites orbitam a Terra, além de mais de 100 trilhões de pedaços de antigos satélites, que continuam circulando o planeta, com alguns eventualmente caindo na atmosfera e queimando.
Kessler demonstrou que, uma vez que a quantidade de detritos em uma órbita específica atinge a chamada “massa crítica”, as colisões começam a ocorrer mesmo que novos objetos não sejam lançados.
“Quando a cascata de colisões começa, o risco para satélites e espaçonaves aumenta até que a órbita se torne inutilizável,” explica a NASA.
Kessler estimou que esse cenário levaria de 30 a 40 anos para ocorrer. Hoje em dia, alguns especialistas acreditam que já estamos na fase de massa crítica na órbita baixa da Terra, que fica entre 560 e 620 milhas (900 a 1.000 quilômetros) de altitude. Um exemplo disso foi a colisão de um satélite russo desativado com um satélite americano em 2009.
Em 2021, um teste russo destruiu um de seus próprios satélites com um míssil, obrigando os astronautas na ISS a realizar procedimentos de emergência.
Por que a síndrome de Kessler pode acabar com a vida como a conhecemos?
Se satélites e destroços entrarem em uma reação em cadeia de colisões, a vida na Terra pode mudar drasticamente.
Satélites poderiam ser destruídos, levando a apagões massivos de internet e Wi-Fi. Telefones celulares também ficariam inoperantes, já que não haveria satélites para processar as ligações. Além disso, isso poderia significar o fim da televisão e do GPS.
Outro impacto seria a perda de satélites meteorológicos, prejudicando nossa capacidade de monitorar e prever condições climáticas adversas, o que afetaria indústrias como agricultura, pesca e transporte.
Conforme explicam Amrith Mariappan e John L. Crassidis em seu artigo de 2023 intitulado “Síndrome de Kessler: um desafio para a humanidade”:
“Satélites de sensoriamento remoto também desempenham um papel crucial no monitoramento de fenômenos como inundações, secas, incêndios florestais e na vigilância de infraestrutura.” Esses satélites são usados até para fins militares, capturando imagens estratégicas e monitorando atividades inimigas.
O artigo também destaca que a síndrome de Kessler pode afetar o setor de saúde, desligando dispositivos médicos que dependem de satélites.
Se alcançarmos o estágio de “massa crítica”, como Kessler descreveu, se tornará perigoso demais enviar qualquer coisa ao espaço, devido à enorme quantidade de detritos orbitando a Terra em alta velocidade.
Como prevenir a síndrome de Kessler?
Mariappan e Crassidis propõem que “a reciclagem de detritos espaciais surge como uma solução promissora e sustentável a longo prazo para mitigar os detritos espaciais.”
Uma solução a curto prazo adotada por alguns é desorbitar o lixo espacial e deixá-lo queimar na atmosfera da Terra. No entanto, isso pode gerar riscos e contribuir para problemas ambientais, como a destruição da camada de ozônio.
“Ao reutilizar satélites desativados e detritos para criar materiais úteis em outras missões espaciais, essa estratégia de reciclagem promove a sustentabilidade ambiental e a eficiência no uso de recursos na exploração espacial,” afirmam os autores.
A Agência Espacial Europeia (ESA) anunciou que pretende se tornar “neutra em detritos” até 2030, o que significa que não adicionará mais detritos à órbita da Terra. Até 2050, o objetivo é reutilizar partes de satélites em novas missões.
Resta saber se a humanidade será capaz de impedir que a síndrome de Kessler se torne realidade. As iniciativas estão em andamento, e tudo o que podemos fazer é torcer para que sejam suficientes.
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