Relatório bombástico diz que estudo usado como referência sobre o Alzheimer usou resultados falsos

O artigo, citado em mais de 2.200 trabalhos acadêmicos como referência, é alvo de investigação de manipulação de dados

de Redação Jornal Ciência 0

Um estudo seminal de 2006 sobre a doença de Alzheimer pode conter resultados fabricados, segundo uma investigação da revista científica Science. As informações são do portal de notícias Business Insider.

A reportagem divulgada nesta segunda-feira (25/07), mostra que a investigação descobriu evidências de vários casos de manipulação de exames de imagens no trabalho de Sylvain Lesné, pesquisador que trabalha na Universidade de Minnesota e autor do estudo de 2006 — usado por milhares de profissionais ao redor do mundo como referência para acadêmicos, pesquisadores, cientistas e profissionais de saúde.  

O artigo, citado em mais de 2.200 trabalhos acadêmicos como referência, despertou o interesse em uma proteína específica chamada Aβ*56 como um alvo promissor para intervenção precoce na doença de Alzheimer.

Aβ*56 é uma beta-amiloide. As beta-amiloides são proteínas que se aglomeram no cérebro, um fenômeno que se acredita estar ligado ao desenvolvimento da doença de Alzheimer. Vários tipos diferentes dessas proteínas são alvos de medicamentos estudados com potencial de tratar a doença de Alzheimer.

A denúncia partiu de Matthew Schrag, neurocientista da Universidade Vanderbilt, o primeiro a denunciar ao departamento de saúde pública dos EUA, demonstrando preocupações sobre as imagens, em janeiro de 2022.

A revista Science pediu a dois especialistas em análise de imagens para revisar o trabalho publicado de Lesné, buscando sanar as preocupações do cientista denunciante.

Eles identificaram um total de 20 “artigos suspeitos” de autoria de Lesné, 10 dos quais tinham a ver com Aβ*56, segundo a revista Science.

A publicação não chegou a alegar má conduta ou fraude, afirmando que as imagens originais teriam que ser investigadas para que a manipulação fosse confirmada.

O efeito mais “óbvio” dessa suposta manipulação seria “desperdício de financiamento público e desperdício de pensamento no campo”, disse o prêmio Nobel e neurocientista da Universidade de Stanford, Thomas Südhof, à Science.

Vários pesquisadores não identificados disseram ao Alzforum, uma agência focada em Alzheimer, que tentaram reproduzir os resultados do estudo de 2006, mas não conseguiram. Trabalhos como este dificilmente são publicados, porque é difícil publicar resultados que invalidam trabalhos acadêmicos anteriores.

“Mesmo que a má conduta seja rara, ideias falsas inseridas em nós-chave em nosso corpo de conhecimento científico podem distorcer nossa compreensão”, disse Shrag à Science, o neurocientista que fez a denúncia. A Nature, a revista acadêmica que publicou o estudo de 2006, está investigando as alegações sobre o artigo, de acordo com uma nota da editora à Business Insider.

Este é o mais recente escândalo sobre o conhecimento da doença de Alzheimer. Isso ocorreu após cientistas demonstrarem preocupação com a base de evidências que apoiam a ideia de que o medicamento Aducanumab, aprovado pela FDA dos EUA, pode melhorar a cognição em pessoas com Alzheimer.

Embora as alegações sobre o trabalho de Lesné sejam preocupantes, elas não comprometem o campo da pesquisa sobre as proteínas amiloides e a doença de Alzheimer, afirma a Alzheimer’s Research UK — instituição britânica de estudo sobre o Alzheimer — em declarações ao Business Insider.

“Apesar dessas alegações, não devemos permitir que o trabalho de milhares de pesquisadores de Alzheimer seja prejudicado — seus esforços meticulosos estão nos aproximando de novos tratamentos vitais para milhões de pessoas que vivem com a doença”, comentou Sara Imarisio, do Alzheimer’s Research UK, em comunicado.

“Existem questões e críticas legítimas à hipótese amiloide, mas essas questões são uma parte perfeitamente normal e necessária da ciência”, disse ela.

Uma coautora dos artigos de Lesné, Karen Hsiao Ashe, defende o papel da proteína Aβ*56 na doença de Alzheimer, afirmando que cientistas da equipe “detectam regularmente e de forma reprodutível a Aβ*56” em camundongos de laboratório.

Todas as possíveis evidências de manipulação de imagens no estudo foram encontradas nos trabalhos apresentados por Karen em coautoria com Lesné e não em coautoria com outros cientistas da equipe. Lesné não foi encontrado pela Business Insider para comentar a investigação da revista Science.

Fonte(s): Business Insider / Science Alert Imagens: Reprodução / Veja

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