Sem cortes ou arranhões e presença de suor, e apesar do fato de perdermos cerca de 500 milhões de células a cada 24 horas, nossa pele não corre o risco de começar a vazar indiscriminadamente.
Ainda, de alguma forma, substituímos toda a nossa camada externa de pele a cada duas ou quatro semanas, e nem assim os vazamentos ocorrem, mas agora, cientistas no Reino Unido descobriram a razão por trás disso, de acordo com informações da Science Alert.
Segundo o pesquisador Reiko Tanaka, um dos membros da equipe do Imperial College, de Londres, o estudo serviu para ajudar a entender como as células que compõem a pele podem mudar para um mecanismo que produz uma espécie de cola, “que liga as células, garantindo que a pele mantenha a sua integridade”. Para isso, a equipe decidiu investigar as várias camadas que formam a epiderme de mamíferos.
Em estudos anteriores, pesquisadores descobriram que a epiderme dos mamíferos é composta por duas barreiras principais, presentes nas duas camadas superiores da pele. Mais próxima à superfície está uma interface de ar e líquido formada pela camada mais externa da pele – chamada estrato córneo. Abaixo desta, há uma outra interface de líquido formada por ligações mais próximas, consideradas áreas incrivelmente estreitas entre as células epiteliais – que são praticamente impermeáveis.
Enquanto a camada mais externa da epiderme, que constantemente perde células mortas, substituindo-as por novas, é a mais estudada, pouco se sabe sobre a fina barreira cutânea secundária que existe abaixo dela, o chamado estrato granuloso, crucial para garantir a estabilidade de fluídos.
Para que a pele dos mamíferos libere as células mortas, novas devem ser produzidas de forma contínua nas camadas mais internas da epiderme, antes de serem movidas para cima no estrato granuloso. No entanto, até o momento, ninguém sabia ao certo como as células do estrato poderiam ser substituídas sem que houvesse intromissão na barreira de junção estreita que impede os vazamentos de fluídos corporais.
Então, Tanaka e sua equipe utilizaram uma técnica de imagem, chamada de microscopia confocal, para examinar as células do estrato granuloso dos ouvidos de camundongos. Eles descobriram que o formato dessas células, basicamente uma versão achatada de um tetracaidecaedro de Kelvin – um poliedro de 14 lados com seis lados retangulares e oito hexagonais – é crucial para o tipo de barreira que formam.
Tal estrutura foi proposta pela primeira vez em 1887, pelo físico e matemático britânico, William Thomson (Lorde Kelvin), que declarou ser esta a melhor forma para se preencher um espaço.
Nas camadas de epiderme dos ratos, uma versão mais achatada desse poliedro parece formar junções mais apertadas em cada uma das arestas, assegurando que uma barreira contínua seja mantida apesar das constantes idas e vindas de células individuais. “É incrível pensar que um conceito abstrato que foi concebido pelo matemático Lord Kelvin há mais de um século pode ser uma forma importante na natureza para ajudar nossa pele a manter sua eficácia como uma barreira”, disse Tanaka.
A equipe também descobriu que tal formato permite que as novas células substituam as velhas e produzam uma proteína que atua como uma espécie de cola temporária, mantendo-as embaixo das junções aperadas, de modo que, mesmo se as células superiores forem perdidas, a barreira permanecerá intacta.
Há de se considerar que a experiência fora realizada na pele de ratos, embora a epiderme de todos os mamíferos seja muito semelhante, especialmente as camadas mais profundas. No entanto, os pesquisadores afirmaram que corneócitos – tipo de célula da camada mais externa da epiderme – são mais variados entre os seres humanos do que em ratos. Logo, o modelo de geométrico ainda se aplica, e isso de fato poderia fazer uma grande diferença em estudos relacionados a condições de pele. Uma melhor compreensão da epiderme poderia ajudar a explicar doenças como eczema e a psoríase, consideradas comuns, mas difíceis de serem tratadas.
Algumas “falhas” que ocorrem durante a produção das apertadas junções poderiam ser um fator contribuinte que explicaria porque algumas pessoas possuem eczema, por exemplo, em que a barreira da pele é enfraquecida, levando à infiltração bacteriana, inflamações coceira e infecções. “Em outros casos, as falhas poderiam explicar parcialmente por que nos casos de psoríase há uma superprodução de células epidérmicas, causando manchas espessas de pele”, explicou Tanaka.
O próximo passo do estudo, publicado no eLife, é descobrir como a espessura da pele pode determinar as camadas da epiderme, e como o equilíbrio entre o crescimento celular e eliminação de células mortas é mantido, para identificar onde as falhas podem surgir.
[ Scient Alert ] [ Foto: Reprodução / Flickr ]