Cientistas descobriram como nossos cérebros “afiam” nossas memórias enquanto dormimos

de Julia Moretto 0

Os cientistas há muito tempo entendem que nossas memórias dependem de conexões entre os neurônios em nosso cérebro, porém ainda não está claro como o sono ajuda a consolidar essa informação.

 

Dois novos estudos encontraram evidências biológicas de que se quisermos lembrar de algo, precisamos dormir. É natural que estejamos curiosos sobre por que ficamos inconscientes por até 16 horas por dia. Uma hipótese recente sugeriu que o sono acaba com proteínas potencialmente tóxicas que se acumulam no cérebro durante o dia. Estudos descobriram que, se não dormirmos o suficiente, aumentamos nosso risco de desenvolver doença cardiovascular e diabetes tipo 2, além de doenças neurodegenerativas, como Parkinson.

 

Porém, uma nova pesquisa realizada na Universidade de Wisconsin e na Universidade de Johns Hopkins forneceu evidências dos benefícios do sono, sugerindo que ele permite que as ligações sejam feitas quando nós acordamos. A chamada hipótese da homeostase sináptica não é nova: pesquisadores da Universidade de Wisconsin desenvolveram a ideia há mais de uma década, propondo que o sono permite que nosso cérebro corte as conexões que se desenvolvem entre os nossos neurônios enquanto estamos acordados, a fim de tornar nossas memórias mais claras.

 

À medida que experimentamos coisas novas, nossos cérebros constroem ou enfraquecem conexões chamadas sinapses, que ligam nossas células nervosas. Os comportamentos e memórias que desenvolvemos são codificados nessas redes interconectadas de neurônios, que dependem do tamanho e da força da sinapse para comunicar mensagens de forma eficaz. Os biólogos responsáveis pela hipótese da homeostase sináptica argumentam que o processo de construção de tais redes é um pouco excessivo durante nossas horas de vigília. O sono fornece uma oportunidade silenciosa para o cérebro seletivamente descansar as redes que construímos enquanto estamos conscientes.

 

Há muitas evidências de que os neurônios podem cortar sinapses, em alguns casos, através de células que patrulham o cérebro. Comparações dos períodos de sono e a privação de sono também podem ser uma evidência indireta do cérebro remodelar as sinapses. A equipe da Universidade de Wisconsin conseguiu ainda mais provas para sustentar sua hipótese. Nos últimos quatro anos, os biólogos analisaram as aparas do cérebro de um grupo de camundongos que tinham dormido, outros que tinham sido mantidos acordados e entretidos com brinquedos, e de alguns mais que ficaram acordados, mas não estimulados.

 

Os cientistas então mediram o tamanho e a forma de cerca de 6.920 sinapses em centenas de seções cerebrais. As fatias retiradas dos camundongos que tinham dormido continham sinapses 18% menores que as sinapses dos que estavam acordados. Essas sinapses reduziram significativamente os nervos com menores espinhas dendríticas – protuberâncias que levam informações de uma sinapse para o nervo axônio. Em outras palavras, o aprendizado estabelecido estava sendo poupado.

 

Durante a vigília, a aprendizagem fortalece as conexões sinápticas em todo o cérebro, aumentando a necessidade de energia e saturando o cérebro com novas informações. O sono permite que o cérebro redefina o material recém-aprendido com memórias consolidadas“, explicou o membro da equipe Giulio Tononi, da Universidade de Wisconsin. A equipe de biólogos da Universidade Johns Hopkins abordou a questão sob um ângulo diferente.

 

Eles marcaram proteínas nas sinapses de ratos vivos com um marcador fluorescente e, em seguida, observaram os cérebros do rato enquanto dormiam. Como era esperado, as sinapses diminuíram de tamanho, assim como os marcadores. Outras análises revelaram uma queda de 20% no receptor de AMPA. Após isso, manipularam ratos geneticamente para deixá-los sem um tipo de proteína chamado Homer1A, um produto químico conhecido como desencadeador da remoção de receptores em sinapses.

 

A fim de estudar os efeitos que isso teria sobre a memória, os ratos foram deixados em uma caixa com um painel eletrificado no chão. Naquela noite, alguns dos camundongos foram tratados com um produto químico que impediu o Homer1A de entrar nas espinhas dendríticas. Quando observados no dia seguinte, os ratos estavam amedrontados pela caixa, no entanto, os ratos com sinapses reduzidas, ao serem colocados em outra caixa, voltavam ao normal. Os ratos que tinham sido tratados com bloqueadores de Homer1A estavam congelados de medo.

 

Embora seja difícil de dizer o que estava passando nas mentes dos roedores, os pesquisadores concluíram que eles foram confundidos por semelhanças entre as caixas. Em vez de terem uma recordação nítida da experiência do dia anterior, os ratos acharam difícil distinguir o que era importante. O sono é um comportamento incrivelmente complexo que está associado a funções biológicas: da nossa imunidade à digestão. Portanto, é difícil de entender a “razão” de dormirmos. Ambos os estudos foram publicados na Science.

[ Science Alert ] [ Fotos: Reprodução / Nature ] 

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