O que o budismo e a Ciência têm em comum?

de Julia Moretto 0

Evan Thompson, da Universidade de British Columbia, no Canadá procurou analisar os conceitos da crença budista da “anatta”, ou “não eu”.

Desde o final dos anos 1980, quando o Instituto Mente e Vida foi criado por Dalai Lama e um grupo de cientistas, a Neurociência tem se interessado pelo budismo. Com as análises, foi possível compreender o que os monges já sabiam: é possível mudar o seu cérebro apenar com a forma que você pensa.

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A anatta consiste na ideia de que não há um você constante. A ideia de que somos os mesmos de um momento para o outro ou de um ano para o outro, é meramente uma ilusão. “O cérebro e o corpo estão constantemente em fluxo. Não há nada que corresponda ao sentido de que há um eu imutável”, comenta Thompson.

Um artigo publicado na revista “Trends in Cognitive Sciences”, defende a ideia da crença budista de que nosso “eu” muda constantemente de área em nosso cérebro.  Segundo os autores, “autoprocessamento no cérebro não é instanciado em uma determinada região ou rede, mas se estende a uma ampla gama de flutuação de processos neurais que não parecem ser autoespecíficos”.

Para Thompson, que possui estudos sobre Ciência Cognitiva, Fenomenologia e Filosofia budista, essa não é a única área em que o budismo e a Neurociência se comunicam. Mas nem a Neurociência e nem o budismo possuem resposta sobre como a consciência e o cérebro se relacionam. Ambos campos divergem sobre alguns aspectos. Para os budistas, existe uma forma de consciência que não depende do corpo físico. Já Thompson e outros neurocientistas discordam dessa ideia.

Porém, o pesquisador acredita na ideia budista de que o “eu” realmente existe. “Na Neurociência, muitas vezes você se depara com pessoas que dizem que o eu seja uma ilusão criada pelo cérebro. Minha opinião é que o cérebro e o corpo trabalham em conjunto no contexto de nosso ambiente físico para criar um senso do eu. E é equivocado dizer que só porque é uma construção, é uma ilusão”, explica.

Mais desapego e liberdade

É interessante ler um texto que você tenha escrito há alguns anos. É notável que seus interesses, perspectivas e crenças mudaram de alguma maneira. Anatta, não quer dizer que não exista nenhum você, apenas que você está em evolução constante. Mas por que isso é importante?

Segundo Rick Hanson, autor dos livros “Hardwiring Happiness” e “Buddha’s Brain”, quando não existe um eu constante, não devemos levar tudo para o pessoal. Ou seja, nossos pensamentos são apenas pensamentos e não nos definem. Outros eventos externos são apenas eventos externos e não acontecem diretamente com nós mesmos. Assim explica a professora de budismo e meditação Tara Brach, “nossos pensamentos são reais, mas não são verdadeiros”.

Podemos sentir uma libertação em não nos identificarmos com a ideia concreta de quem nós somos. E é dessa maneira que podemos crescer e mudar, com o auxílio da neuroplasticidade. Dessa forma, também há a esperança de que possamos superar nossos hábitos, pois não estamos presos às crenças autolimitantes inerentes e a um eu consistente, podemos nos tornar qualquer ser que quisermos.

Enquanto a Ciência e o pensamento oriental discutem teorias, podem existir outros estudos com base em pensamentos de 2.600 anos de idade. “Suponha que algo seja definitivamente comprovado através da investigação científica. Suponhamos que esse fato seja incompatível com a teoria budista. Não há dúvida de que devemos aceitar o resultado da pesquisa científica”, disse Dalai Lama no livro “Buddhism and Science: Breaking New Ground”.

Contudo, podemos perceber que o budismo e a Neurociência possuem o objetivo de descobrir os mistérios da mente e saber como podemos usá-la para nos tornarmos seres mais felizes.

[ Big Think ] [ Fotos: Reprodução / Pixabay / Pixabay ]

Jornal Ciência