Mandrágora: A famosa planta de Harry Potter existe e tem história milenar de cura e misticismo

de Redação Jornal Ciência 0

Mandrágora: A famosa planta de Harry Potter existe e tem história milenar

A famosa planta Mandrágora, evidenciada no filme Harry Potter e a Câmara Secreta, realmente existe. É famosa desde os tempos antigos por ter aparência que lembra um “feto humano”.

No filme, ela possui um formato antropomórfico que emite um grito letal quando arrancada — necessitando tapar os ouvidos antes de desenterrá-la. O que poucos sabem é que sua história tem origem milenar, sendo uma das plantas mais conhecidas dos primórdios da medicina.  

Mandrágora: A famosa planta de Harry Potter existe e tem história milenar
Ilustração de Mandrágora retirada do manuscrito Tacuinum Sanitatis do século 15

A lenda antiga dizia que a planta representava um pequeno homem sob a terra e, se fosse retirado de seu descanso, sendo arrancado, daria um grito capaz de deixar as pessoas surdas ou até matá-las. Por isso veio o apelido de Mandrágora — que significa “a planta que grita”.

Seu nome científico é Mandragora officinarum, sendo famosa por ter propriedades medicinais, com alegações afrodisíacas, alucinógenas, analgésicas, narcóticas, sedativas e purgantes. Foi muito usada na antiguidade para aliviar dores, tratar problemas do sistema nervoso e úlceras.

Ela dá frutos amarelos “suculentos” com aparência de tomates, muito cheirosos, porém são extremamente tóxicos, chamados antigamente de “maçãs do diabo” pelos árabes, que acreditavam causar efeito afrodisíaco.

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Flor da Mandrágora

Jamais deve ser criada em casa. A Mandrágora é muito alucinógena e pode representar risco à saúde. Ela possui duas moléculas perigosas — atropina e escopolamina — que podem gerar graves quadros de envenenamento e morte por parada respiratória. Costuma matar animais, já que seus frutos são muito atraentes. Quem tenta cultivá-las em casa, geralmente não conseguem, pelas exigências específicas de clima, por serem nativas do Mediterrâneo.

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Frutos da Mandrágora

História

O médico grego Pedanius Dioscorides, que viveu entre os anos 40 e 90, na época dos imperadores romanos Nero e Vespasiano, usava a raiz da Mandrágora fervida em vinho, para ser usada como anestésico na Roma Antiga.

O médico sempre alertava: “tome demais e acabará morto”, pois já tinha consciência dos poderes tóxicos da planta. Ele sabia que, como todo medicamento, a diferença entre cura e morte está na dose.

Pedanius Dioscorides foi uma das primeiras e mais importantes referências científicas sobre a Mandrágora para uso medicinal. Ele descreve em seus manuscritos uma Mandrágora “macho” e outra “fêmea”. Hoje, sabemos que ele estava equivocado e descrevia duas espécies diferentes, a Mandragora officinalis e a Mandragora autumnalis.

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Manuscrito do século 7 retirado do material médico produzido por Pedanius Dioscorides

Mitologia, crença e misticismo

A planta era considerada “mágica”, conhecida como a “rainha das plantas” na Idade Média. Era tão famosa que foi mencionada na Bíblia. “E foi Rúben nos dias da ceifa do trigo, e achou mandrágoras no campo. E trouxe-as a Lia, sua mãe. Então disse Raquel a Lia: Ora, dá-me das Mandrágoras do teu filho”, Gênesis, capítulo 30, versículo 14.

No livro do Gênesis, a raiz de Mandrágora ajuda Raquel a conceber Jacó. Já na Mitologia Grega, dizia-se que Circe e Afrodite usavam a raiz como afrodisíaco.

Os textos antigos acreditavam que a planta “gritaria” ao ser arrancada da terra. Começou a existir a crença que, por ter formato “humano”, cada parte do “corpo” da planta poderia ser usada para tratar a respectiva área do corpo humano. Assim, a “cabeça” da Mandrágora tratava doenças e dores de cabeça de um paciente.

Mitos surgiram que ela poderia ser usada para ajudar casais a conceber um bebê. Pegando uma Mandrágora com formato bem nítido de feto e colocando embaixo do travesseiro, todas as noites, ajudaria a mulher tornar-se fértil.

Outra crença surgiu dizendo que, se um homem encontrasse uma Mandrágora com formato de corpo feminino e carregasse no bolso, ajudaria conquistar a mulher amada. O mesmo aconteceria se uma mulher carregasse uma Mandrágora com formato de corpo masculino.

Em toda a Europa, homens e mulheres procuravam desesperadamente a raiz de Mandrágora para resolver seus problemas amorosos, o que fez charlatães e estelionatários falsificarem a raiz de outra planta, a Bryonia alba. Eles esculpiam a raiz dessa planta para ter aparência de Mandrágora masculina ou feminina, e vendiam para satisfazer a altíssima demanda da época por um “amuleto” de conquista.

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Espécie Bryonia alba que era usada pelos falsificadores para vender aos que buscam sorte no amor

Bruxas

Bruxas e feiticeiros usavam as raízes, frutos e folhas da planta como amuletos, poções, unguentos (medicamento de uso externo à base de gordura), óleos e outras misturas para atrair amor, riqueza ou poder que seus clientes e amigos desejavam.

Quando eram ingeridos ou absorvidos pela pele, os alcaloides da raiz da Mandrágora exerciam o suposto “poder mágico”, provocando alucinações, excitação e sonolência — mas às vezes causava coma e morte.

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Uma Mandrágora com 2 anos de cultivo

As bruxas não usavam essas plantas para prejudicar as pessoas, mas sim para curar. Elas agiam como verdadeiras farmacêuticas. Através da experimentação, conseguiam entender qual a dose era considerada curativa e qual poderia ser tóxica e matar.

No final do período medieval, o cristianismo tornou-se cada vez mais dogmático e procurou acabar com toda a prática de curandeirismo. Práticas baseadas em ervas e plantas tradicionais, como a Mandrágora, foram rotuladas como demoníacas, e rapidamente desapareceram da esfera popular.

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Uma mandrágora com 15 anos de cultivo

Bruxas e feiticeiros acabaram com má reputação de praticarem rituais demoníacos com a planta e tiveram que usá-la escondida do conhecimento geral para não serem ameaçados ou condenados à morte pela Igreja Católica.

Fonte(s): Atlas Obscura / CancerLynx / History Extra Imagens: Reprodução / Atlas Obscura

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