A famosa planta Mandrágora, evidenciada no filme Harry Potter e a Câmara Secreta, realmente existe. É famosa desde os tempos antigos por ter aparência que lembra um “feto humano”.
No filme, ela possui um formato antropomórfico que emite um grito letal quando arrancada — necessitando tapar os ouvidos antes de desenterrá-la. O que poucos sabem é que sua história tem origem milenar, sendo uma das plantas mais conhecidas dos primórdios da medicina.
A lenda antiga dizia que a planta representava um pequeno homem sob a terra e, se fosse retirado de seu descanso, sendo arrancado, daria um grito capaz de deixar as pessoas surdas ou até matá-las. Por isso veio o apelido de Mandrágora — que significa “a planta que grita”.
Seu nome científico é Mandragora officinarum, sendo famosa por ter propriedades medicinais, com alegações afrodisíacas, alucinógenas, analgésicas, narcóticas, sedativas e purgantes. Foi muito usada na antiguidade para aliviar dores, tratar problemas do sistema nervoso e úlceras.
Ela dá frutos amarelos “suculentos” com aparência de tomates, muito cheirosos, porém são extremamente tóxicos, chamados antigamente de “maçãs do diabo” pelos árabes, que acreditavam causar efeito afrodisíaco.
Jamais deve ser criada em casa. A Mandrágora é muito alucinógena e pode representar risco à saúde. Ela possui duas moléculas perigosas — atropina e escopolamina — que podem gerar graves quadros de envenenamento e morte por parada respiratória. Costuma matar animais, já que seus frutos são muito atraentes. Quem tenta cultivá-las em casa, geralmente não conseguem, pelas exigências específicas de clima, por serem nativas do Mediterrâneo.
História
O médico grego Pedanius Dioscorides, que viveu entre os anos 40 e 90, na época dos imperadores romanos Nero e Vespasiano, usava a raiz da Mandrágora fervida em vinho, para ser usada como anestésico na Roma Antiga.
O médico sempre alertava: “tome demais e acabará morto”, pois já tinha consciência dos poderes tóxicos da planta. Ele sabia que, como todo medicamento, a diferença entre cura e morte está na dose.
Pedanius Dioscorides foi uma das primeiras e mais importantes referências científicas sobre a Mandrágora para uso medicinal. Ele descreve em seus manuscritos uma Mandrágora “macho” e outra “fêmea”. Hoje, sabemos que ele estava equivocado e descrevia duas espécies diferentes, a Mandragora officinalis e a Mandragora autumnalis.
Mitologia, crença e misticismo
A planta era considerada “mágica”, conhecida como a “rainha das plantas” na Idade Média. Era tão famosa que foi mencionada na Bíblia. “E foi Rúben nos dias da ceifa do trigo, e achou mandrágoras no campo. E trouxe-as a Lia, sua mãe. Então disse Raquel a Lia: Ora, dá-me das Mandrágoras do teu filho”, Gênesis, capítulo 30, versículo 14.
No livro do Gênesis, a raiz de Mandrágora ajuda Raquel a conceber Jacó. Já na Mitologia Grega, dizia-se que Circe e Afrodite usavam a raiz como afrodisíaco.
Os textos antigos acreditavam que a planta “gritaria” ao ser arrancada da terra. Começou a existir a crença que, por ter formato “humano”, cada parte do “corpo” da planta poderia ser usada para tratar a respectiva área do corpo humano. Assim, a “cabeça” da Mandrágora tratava doenças e dores de cabeça de um paciente.
Mitos surgiram que ela poderia ser usada para ajudar casais a conceber um bebê. Pegando uma Mandrágora com formato bem nítido de feto e colocando embaixo do travesseiro, todas as noites, ajudaria a mulher tornar-se fértil.
Outra crença surgiu dizendo que, se um homem encontrasse uma Mandrágora com formato de corpo feminino e carregasse no bolso, ajudaria conquistar a mulher amada. O mesmo aconteceria se uma mulher carregasse uma Mandrágora com formato de corpo masculino.
Em toda a Europa, homens e mulheres procuravam desesperadamente a raiz de Mandrágora para resolver seus problemas amorosos, o que fez charlatães e estelionatários falsificarem a raiz de outra planta, a Bryonia alba. Eles esculpiam a raiz dessa planta para ter aparência de Mandrágora masculina ou feminina, e vendiam para satisfazer a altíssima demanda da época por um “amuleto” de conquista.
Bruxas
Bruxas e feiticeiros usavam as raízes, frutos e folhas da planta como amuletos, poções, unguentos (medicamento de uso externo à base de gordura), óleos e outras misturas para atrair amor, riqueza ou poder que seus clientes e amigos desejavam.
Quando eram ingeridos ou absorvidos pela pele, os alcaloides da raiz da Mandrágora exerciam o suposto “poder mágico”, provocando alucinações, excitação e sonolência — mas às vezes causava coma e morte.
As bruxas não usavam essas plantas para prejudicar as pessoas, mas sim para curar. Elas agiam como verdadeiras farmacêuticas. Através da experimentação, conseguiam entender qual a dose era considerada curativa e qual poderia ser tóxica e matar.
No final do período medieval, o cristianismo tornou-se cada vez mais dogmático e procurou acabar com toda a prática de curandeirismo. Práticas baseadas em ervas e plantas tradicionais, como a Mandrágora, foram rotuladas como demoníacas, e rapidamente desapareceram da esfera popular.
Bruxas e feiticeiros acabaram com má reputação de praticarem rituais demoníacos com a planta e tiveram que usá-la escondida do conhecimento geral para não serem ameaçados ou condenados à morte pela Igreja Católica.
Fonte(s): Atlas Obscura / CancerLynx / History Extra Imagens: Reprodução / Atlas Obscura