Cogumelos “mágicos” estão ajudando pacientes com medo de morrer

de Merelyn Cerqueira 0

Em 2011, pesquisadores da Universidade de Nova York, testaram uma substância que acreditavam ter uma capacidade aparentemente “mística” para tratar depressão e ansiedade associadas ao medo da morte.

Tratava-se de um componente essencial presente em cogumelos “mágicos” psicoativos, chamado psilocibina. Uma voluntária, chamada Dinah Bazer, diagnosticada com câncer de ovário no ano anterior, se inscreveu para participar do experimento, e contou em uma entrevista para Business Insider como funcionou o processo.

Residente do Brooklyn e já na faixa dos 60 anos de idade, ela teve sua doença tratada com sucesso por meio de quimioterapia. No entanto, o medo de uma nova ocorrência não desapareceu. Assim, em 2011, ela se inscreveu para participar do experimento em questão, em que os pesquisadores estavam considerando a possibilidade de testar uma substância para ajudar a cuidar de depressão e ansiedade relacionadas ao medo de morte. Então, acompanhada de terapeutas treinados, ela tomou um comprimido feito a partir dos cogumelos psicoativos. Sem saber se era a droga ou um placebo, ela experimentou uma “viagem” que durou cerca de 40 minutos.

“Eu visualizava meu medo como uma massa física dentro do meu corpo”, contou. No entanto, a sensação logo desapareceu, juntamente com o medo, a depressão e a ansiedade.

Bazer teria participado de um dos dois ensaios clínicos controlados feitos pela Universidade de Nova York (NYU) e Universidade John Hopkins (JHU), para verificação dos efeitos da psilocibina em pacientes que lidam com a depressão e sofrimento relacionado ao medo do fim da vida. Os resultados foram publicados no mesmo ano no Journal of Psychopharmacology, juntamente com 10 comentários de proeminentes especialistas no campo da psiquiatria.

Embora os resultados dos testes tenham sido classificados como encorajadores, os cientistas ainda esperam obter o consentimento da FDA (Food and Drug Administration) para avançar à fase 3, de grande escala. Este terceiro e último passo é essencial para que seja considerada a aprovação para um novo medicamento.

Em certo sentido, trata-se de um grande passo no campo de pesquisa que envolve o poder das substâncias psicodélicas. Durante os anos 50 e 60, psiquiatras ficaram encantados com o poder do LSD, da própria psilocibina e outros alucinógenos que pareciam ser capazes de reorganizar a forma como os pacientes viam o mundo, ajudando-os a superar casos de alcoolismo e outras dependências. No entanto, a proibição de drogas enterrou essas pesquisas por décadas.

Em entrevista a Business Insider, Roland Griffiths, professor de Psiquiatria e Ciências Comportamentais na Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins, disse que a equipe de cientistas começou a realizar experimentos em voluntários saudáveis por volta de 2000, num momento em que a sugestão chocava os conselhos, que a consideravam perigosa. Mas, lentamente, ele conseguiu convencê-los e começou a recrutar voluntários que nunca tinham experimentado LSD ou os cogumelos “mágicos”.

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Dose única

Depois que os pesquisadores estudaram um número de pessoas saudáveis, alguns elementos sobre os efeitos da psilocibina ficaram mais claros. Em um contexto terapêutico, não foram encontrados efeitos adversos graves ou duradouros, o que não significava que fossem totalmente livres de riscos.

Em outro artigo feito sobre o tema, Griffiths relatou que algumas pessoas disseram ter experimentado experiências difíceis ou perigosas, algumas das quais precisaram de tratamento psicológico mais tarde. No entanto, em um cenário clínico, uma alta porcentagem de voluntários relatou que a experiência fora uma das mais significativas que já tiveram na vida.

O mais atraente para os pesquisadores foi o fato de que a substância parecia ser confiável e consistentemente induzia o que conhecemos como “experiências místicas”. Os efeitos foram considerados tão poderosos que os pesquisadores resolveram tentar a psilocibina em pacientes diagnosticados com câncer ou outras doenças de risco de vida, que lutavam também contra a depressão e ansiedade. Então, foram fornecidos aos pacientes uma única dose de 20 miligramas de psilocibina (para pessoas de 70 quilos). Dentro de 20 a 40 minutos eles começaram a sentir os efeitos, enquanto ouviam música durante toda a experiência. O psicoativo desapareceu dentro de quatro horas, razão pela qual os pesquisadores o preferem ao LSD, cujo efeito pode durar até 12 horas.

No estudo realizado pela JHU, mesmo seis meses depois da experiência, cerca de 80% dos 51 participantes apresentaram reduções significativas na depressão e ansiedade. Já na pesquisa de NYU, 60% – 80% dos 29 participantes apresentaram uma redução similar dos sintomas em um período de seis meses e meio.

Pesquisadores têm caracterizado o caso como um inverso do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), em que uma experiência terrível pode mudar a forma como o cérebro de uma pessoa percebe o mundo. No caso, a psilocibina agiu como uma experiência única e significativa, muito valorizada pelos pacientes, e com efeitos transformadores e duradouros. No entanto, vale ressaltar que ainda é cedo para qualquer constatação, uma vez que as pesquisas ainda estão em testes iniciais e a droga é considerada proibida, o que significa que, legalmente, não possui aceitação médica.

“Estamos em níveis muito primitivos de compreensão de experiências mais profundas deste tipo”, disse Griffiths. “Este é apenas um processo longo e contínuo. Quando eu iniciei esta pesquisa, a maioria dos meus colegas era cética. As pessoas pensavam que eu tinha ficado louco. Agora eu recebo ligações todo o tempo de alunos que estão familiarizados com o que estou fazendo e pedem para fazer parte”. “Em tempo, acredito que em 10 ou 20 anos, vamos ter aprendido a otimizar o uso desses compostos, e vamos ter realmente bons modelos para usá-los terapeuticamente”, explicou.

[ Science Alert ] [ Fotos: Reprodução / Science Alert ]

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