Geneticistas criam camundongos machos a partir de cromossomos femininos

de Merelyn Cerqueira 0

Pela primeira vez, pesquisadores conseguiram produzir camundongos do sexo masculino sem nenhum traço do cromossomo Y, responsável por carregar os genes que definirão as características masculinas. Eles não só são saudáveis, como também foram capazes de se reproduzir com um pequeno empurrãozinho.

Aparentemente, a constatação vai contra um dos princípios mais fundamentais da biologia: se um organismo herda um cromossomo X, ele será do sexo feminino; se herda um cromossomo Y, é masculino. O cromossomo Y tem sido considerado o símbolo da masculinidade, no entanto, ao longo dos últimos anos, os cientistas descobriram evidências de que talvez isso não vá durar por muito tempo: ele está encolhendo muito rapidamente.

Porém, segundo a geneticista Jenny Graves, da Universidade La Trobe, na Austrália, “estamos falando de um período de 166 milhões de anos, o que significa que o cromossomo Y, vem perdendo cerca de 10 de seus 1600 genes ímpares a cada 1 milhão de anos”. Graves ainda calcula que restam 4,5 milhões de anos para eles, e afirma que “a masculinidade como todos conhecemos não está sob nenhuma ameaça”, disse em uma entrevista para o site The Conversation.

Segundo Graves, o X carrega cerca de 1.600 genes com funções variadas, já o Y, quase não tem genes tão específicos. Talvez 50, e apenas 27 deles são responsáveis pelas características masculinas. Sendo assim, olhando para um cenário onde essa ameaça fosse real e inevitável, como seria a vida de um invertebrado sem o cromossomo Y?

Em 2013, pesquisadores liderados pela bióloga reprodutiva Monika Ward, da Universidade do Havaí, queriam descobrir como, exatamente, o cromossomo Y influencia no crescimento de um embrião que se tornaria um macho. Eles acabaram reduzindo esse estudo apenas para dois genes: SRY e Eif2s3y.

Descoberto em 1990, o gene SRY é responsável por iniciar o desenvolvimento dos testículos. No entanto, bebês com cromossomos Y que sofreram algum tipo de mutação nesse gene, acabaram se tornando mulheres. Por outro lado, o Eif2s3y, é responsável por desencadear a produção de espermatozoides. Se um embrião desenvolver os dois genes, ele consequentemente será um menino.

Contudo, seria possível um organismo masculino fértil, mesmo sem os dois genes? É exatamente isso que Ward e sua equipe tentaram descobrir mais recentemente, foi então que eles resolveram transferir estes dois genes para dentro de um cromossomo X.

Segundo Ward, a substituição aconteceu entre genes de funções similares. “Eles ocuparam os lugares de genes que eram próximos dessa linha, e ao invés de deixá-los ativarem-se sozinhos, fizemos isso manualmente”.

O resultado: os machos nasceram com testículos menores do que o natural, porém saudáveis. No entanto os espermatozoides deles não possuíam caudas, o que impedia que eles se reproduzissem sem uma pequena assistência. Curiosamente, foram necessárias pelo menos cinco cópias dessa versão do gene Eif2s3y em um cromossomo X para produzir esses machos com espermatozoides inférteis. Enquanto que, nos cromossomos Y, é necessária apenas uma cópia do Eif2s3y. O que indica que essa versão do gene dentro do cromossomo Y é muito mais forte.

Para Ward, o resultado de sua pesquisa, que foi publicada pela revista Science, prova o seu ponto de vista de que é possível contornar uma possível perda do cromossomo Y. No entanto, ela ainda pretende descobrir muito mais sobre outras funções dos genes responsáveis pelas características masculinas e aprimorar o resultado de seu estudo. 

*Na foto de capa, o macho (branco), mesmo não tendo o cromossomo Y, foi capaz de gerar todos os camundongos de cor escura ao lado dele, através de fertilização in vitro.

Fonte: Science Alert / Science Mag Foto: Reprodução / Yasuhiro Yamauchi

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